A preocupação com o ambiente surgiu aquando da sua consciencialização sobre a importância da reciclagem. O plástico, enquanto vilão, ficou mais claro ao aperceber-se que, sem limpeza prévia, qualquer embalagem de plástico não é reciclada. Reconhece, ainda, que os interesses políticos e ambientais não se cruzam tanto quando deveriam. No entanto, por acreditar que a mudança pode partir de cada um de nós, é um dos autores da petição “Abolir o Plástico descartável em Portugal”, que já se encontra a ser analisada no Parlamento. É, ainda, o criador do movimento “Plástico Zero”, que procura partilhar a mensagem da irreversibilidade dos nossos atos para com o planeta. Belarmino Teixeira fala-nos sobre as suas motivações pessoais, as expectativas sobre o movimento e petição e, ainda, os obstáculos que Portugal enfrenta para a concretização de iniciativas políticas sérias que revertam esta situação.
Pergunta da praxe: para além do senso comum de cidadania, o que o atraiu para a mobilização contra o plástico descartável?
É interessante que fale do senso comum, porque eu penso que ele é mais complicado do que parece, e é mais escasso do que a maioria das pessoas pensam.
O senso comum funciona como um senso próprio de cada um e que trabalha no interesse do indivíduo. Se por acaso não houver uma solução de senso comum, então adapto-me de forma a ultrapassar esse obstáculo. E tem sido assim. As pessoas querem sobreviver ou ultrapassar obstáculos e cada vez menos olham aos meios como ultrapassam esses obstáculos. A educação ambiental não existe, mas devia ser essencial nas escolas.
A minha mobilização começou desde que comecei a ser um ávido praticante da reciclagem. Quando percebi que o plástico sujo não estava a ser reciclado, percebi que qualquer embalagem de iogurte que usamos, se não for limpa, vai para um aterro sanitário. Quem é que lava o copo do iogurte? 0,01 da população que se anda a matar e a gastar água e, no fundo, não muda nada. Cheguei à conclusão que só com a política no interesse do ambiente poderia mudar as coisas, de outra forma vamos assistir ao homicídio do nosso planeta pelo comércio sem escrúpulos da indústria barata do plástico.
"A educação ambiental não existe, mas devia ser essencial nas escolas."
Quais foram os principais objetivos traçados com a formação do movimento 'Plástico Zero’?
O movimento surgiu aquando de uma reunião de algumas pessoas que partilham a mesma preocupação ambiental relativamente ao plástico e, mais em concreto, relativamente ao plástico descartável. Uma vez que decorre ainda no Parlamento a análise de uma petição que lancei no ano passado, a luta pela alteração da lei relativamente a esta questão está ainda longe do fim. Neste momento, não temos uma estratégia definida. Tentamos ao máximo partilhar a mensagem e espalhar a ideia de que estamos a criar um ponto sem retorno na destruição do nosso ecossistema.
Tanto a petição como o movimento têm uma origem online. O que tem a dizer sobre a opinião dos que desvalorizam ações online enquanto fontes efetivas de ativismo?
Sem dúvida que as ferramentas online e de carácter rede social são impressionantes na divulgação de mensagens e ideias. Claro que têm efeitos perversos. As pessoas, muitas das vezes, são uma coisa online e em casa são outras. Mais uma vez, tem a ver com a fé própria no que elas podem fazer ou de que modo participam. Se são parte do problema, ou se são parte da luta que pretende mudar as coisas e garantir que vamos ter um planeta saudável para os nossos filhos…
São conhecidos os números - anualmente, 8 milhões de toneladas de plástico nos mares transformam-no no verdadeiro 'predador do mar'. A quantidade de imagens de seres marinhos vítimas do plástico é, infelizmente, crescente. Paradoxalmente, a visibilidade destas situações também tem aumentado. O que falta para que estas duas questões convirjam em resultados palpáveis?
A vontade política e o resultado prático não andam de mão dada. A política, muitas das vezes, tem uma agenda pouco preocupada com o ambiente, mas sim preocupada com as pessoas, com o seu dinheiro e com a economia em geral. Esquecendo-se que sem um planeta saudável não existe economia e paralelamente pode não existir vida. A agenda política tem que ser cada vez mais orientada para uma agenda ambiental e de sustentabilidade. 8 milhões de toneladas, 33 mil mortos são apenas números que nos chegam na forma escrita ou oral aos sofás de nossa casa, onde sentamos confortavelmente ao final do dia. A praia pode estar cheia de lixo. O mar cheio de plástico. As coisas aparentemente só vão mudar quando a escassez de peixe tornar o consumo impraticável. Quando a praia deixar de ser um espaço de lazer e passar a ser uma memória simpática. Nessa altura, porém, será tarde demais…
Já são várias as iniciativas que nos chegam de outros países que os colocam no caminho certo rumo à diminuição da produção e desperdício de plástico. Quais os principais obstáculos à implementação dessas iniciativas, em Portugal?
Na generalidade das situações, Portugal é e será sempre a cauda da Europa, por razões geográficas e outras. As coisas chegam sempre por último a Portugal. Estamos confortavelmente habituados ao longo de muitos anos que assim seja. Estamos politicamente adormecidos. As nossas iniciativas são tardias e pouco originais. E esperamos sempre que alguém dê o passo antes de nós, com medo que sejamos apontados como a criança que fez o erro em frente da turma toda.
"A vontade política e o resultado prático não andam de mão dada."
Com a criação desta petição teve contacto com muitas pessoas - umas mais interessadas e a favor da causa; outras mais revoltadas com a escolha do tema da petição do que, propriamente, com a realidade a que alude. Que imagem esta experiência lhe tem proporcionado dos portugueses em relação a esta questão?
É verdade. Encontramos sempre opiniões de todos os tipos. E claro que podemos sempre tentar entender o lado que diz ‘não concordo’. O português tem um hábito muito grave de discordar. Mas tem pouca capacidade para discordar e apresentar uma alternativa. Por isso, dizer mal é fácil. Apresentar soluções já não é tão fácil. Há uma questão que não é muito clara para muitas pessoas e ela tem a ver com o plástico em si, uma vez que ele assume tantas formas e está presente em tantas coisas à nossa volta. Não se pretende acabar com o plástico. Pretende-se regular o tipo de plástico e a sua utilização. De forma a que o consumo do plástico não seja uma solução fácil, barata e descartável, mas sim uma utilização consciente, necessária e respeitante do ciclo que esse produto pode ter nos circuitos de reciclagem.
Na sua petição, propôs alguns números ambiciosos sobre a produção de materiais biodegradáveis em substituição ao plástico - 10% durante 2018, 50% em 2019, 100% em 2020. Tendo passado o primeiro trimestre do primeiro ano projetado, já tem algumas noções para um primeiro balanço?
As propostas são ideias. No Parlamento, quando o projeto foi discutido, todos os partidos apresentaram datas e períodos de adaptação diferentes. Importa reconhecer, apenas, que algo tem de ser feito e a urgência que este assunto requer. Porque, a cada dia que passa, o dano é maior, o sacrifício das espécies é incrível e a perda é para sempre.
Que conceitos e rotinas diárias sustentáveis podemos adotar para minimizar o impacto no ambiente, especialmente no que ao plástico diz respeito?
Em breve vou começar a lançar desafios diários de pequenas coisas que podemos fazer. Por exemplo, trocar a película aderente por silicone que estica para conservar alimentos. Não usar produtos de alimentação descartável, pratos, talheres, copos. Se as pessoas, quando fossem sair à noite, pedissem um copo de vidro em vez de um copo de plástico, isso iria começar a fazer toda a diferença.
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